O artigo “Dever de Corpo e o PJe-JT”, abaixo, é de autoria do advogado e conselheiro federal por Sergipe Valmir Macedo de Araujo:
Por considerar um exagero a manifestação feita por um dos manifestantes no Ato Público realizado pelo Conselho Federal da OAB em defesa do CNJ, penitencie-me com o “DESCULPAS À MINHA CONSCIENCIA”, que escrevi após a edição das liminares concedidas em favor dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo envolvidos no escândalo do “abono habitação”.
Já no “A OAB E OS CANCELOS DOS TRIBUNAIS”, fiz questão de enfatizar o relacionamento harmonioso vivenciado atualmente pela advocacia e a magistratura no Estado de Sergipe, fruto, inclusive, da simplicidade, respeito, competência e empenho de seus lideres, Desembargador Osório de Araujo Ramos Filho, Presidente do Tribunal de Justiça, e Desembargador Federal Jorge Antonio Andrade Cardoso, Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 20ª. Região, amigos dos advogados como assim já enaltecidos pelo Dr. Carlos Augusto Monteiro, Presidente do Conselho Seccional da OAB/SE.
Na Justiça do Trabalho, esse bom relacionamento vem sendo consolidado mais amiúde no dia a dia forense com a implantação do Processo Judicial Eletrônico, que no meu Estado já é uma realidade com grande parcela de colaboração dos advogados trabalhistas, como assim já mesmo enfatizado por diversas vezes pelo seu Presidente Jorge Cardoso. Aliás, esse clima de respeito e colaboração ficou muito bem denotado na última segunda-feira (18/10), quando o Tribunal Regional do Trabalho, acatando requerimento conjunto da OAB e da ASSAT, determinou a suspensão dos prazos processuais e das audiências em seu âmbito para o período de 07 a 18/01/2013, que favorecerá, assim, com a extensão do recesso deste final de ano, um efetivo descanso de 30 dias ao advogado trabalhista.
Mesmo nessa sinergia do bom relacionamento institucional, a crítica de inconstitucionalidade por quebra do devido processo legal ao disposto do art. 3º, do ATO SGP.PR. Nº 024/2012, que Regulamenta, de forma complementar, a utilização do Sistema de Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho – PJe/JT, no âmbito da Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região, ao estabelecer que “a resposta do réu deverá ser apresentada oralmente em audiência ou encaminhada eletronicamente pelo Sistema de Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho – PJe/JT, com antecedência mínima de 01 (uma) hora”, não pode ser abrandada.
É que, muito embora tenha a ASSAT – Associação dos Advogados Trabalhistas defendido esse Ato normativo do TRT/20, por não enxergar nele nenhuma violação de ofensa às prerrogativas do advogado ou de quebra ao devido processo legal, ao considerar que o alegado vício ficaria corrigido com a possibilidade da apresentação de defesa oral e da opção de sigilo ali assegurada ao advogado para a hipótese de encaminhamento da contestação antes da audiência, na prática não aconteceu.
Pois, como se sabe, a defesa oral, que deveria ser regra na Justiça do Trabalho – falaciosos princípios da simplicidade e da oralidade –, mas tornou-se uma exceção – verificada apenas nas reclamações que comportam pedidos bem modestos e que não são resolvidos pela composição. A prática se evidencia por contestação escrita, com a abordagem ampla e específica de todo direito material em litigio e a utilização completa da técnica de defesa – exceções, preliminares, mérito e reconvenção -, que, se apenas fosse lida para o seu registro em ata, os 20 minutos previstos para a defesa oral seriam facilmente ultrapassados, com o prejuízo de considerável atraso em toda pauta do dia.
A utilização pelo advogado da opção “sigilo”, por sua vez, que poderia mitigar a quebra da regra contida no art. 847, da CLT – contestação na audiência -, tornou-se natimorta com a advertência contida no art. 6º., do referido do Ato, ao estabelecer que a utilização dessa opção – sigilo – é “responsabilidade do advogado e a sua permanência será objeto de apreciação pelo juiz”.
O certo é que o sistema – PJe-JT – vem sendo operado com essa imperfeição, ou seja: a realidade da vida sendo alterada para se amoldar à tecnologia do TJe-JT, quando deveria ser o contrário: a eletrônica em favor do processo como instrumento de realização da Justiça pelo Estado, o que, pela dificuldade acima narrada, não resolveu a situação processual aqui tratada – permitir a entrega da contestação já digitalizada ou de forma eletrônica em mesa de audiência.
Disso hoje resulta sérios prejuízos às partes e à própria administração judiciária, porquanto vem se verificando a ocorrência exagerada – fora dos padrões do processo físico – de desistências de reclamações trabalhistas, ou seja: após o conhecimento prévio pelos patronos dos reclamantes das teses das defesas, com o represamento, ainda, dessas mesmas demandas sob o enfoque das conveniências futuras.
E não pode ser assim. A lei processual é sabia. Por isso, a inteligência do art. 847, da CLT, ao dispor que, “Não havendo acordo, o reclamado terá vinte minutos para aduzir sua defesa, após a leitura da reclamação, quando esta não for dispensada por ambas as partes”.
E este momento é único. Não há outro, sob pena de ficar a defesa fragilizada ao conhecimento prévio e informal do ex-adverso, com ofensa ao devido processo legal, garantia de direito fundamental assim enaltecida por Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido R. Dinamarco, na célebre obra conjunta “Teoria Geral do Processo” (Malheiros Editores, 13a edição, pág. 273/274):
“A ação, como direito de pedir a tutela jurisdicional para determinada pretensão fundada em direito material, tem, assim, uma espécie de réplica na exceção, como direito de pedir que a tutela jurisdicional requerida pelo autor seja denegada por não se conformar com o direito objetivo. O autor, através do exercício da ação, pede justiça, reclamando algo contra o réu; este, através da exceção, pede justiça, solicitando a rejeição do pedido. Tanto como o direito de ação, a defesa é um direito público subjetivo (ou poder), constitucionalmente garantido como corolário do devido processo legal e dos postulados em que se alicerça o sistema contraditório do processo. Tanto o autor, mediante a ação, como o réu, mediante a exceção, têm um direito ao processo”.
Para concluírem:
“Ainda que a reclamada compareça à audiência, munida de defesa e de procurador, com o intuito de contestar os termos da reclamação, o autor pode desistir do processo, sem necessidade de concordância da ré, desde que não tenha chegado o momento de apresentação da defesa.
Por sua vez, o próprio Judiciário Trabalhista, no Acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, já deixou assente que “No processo civil comum, a apresentação de defesa não ocorre na audiência. Mas no processo do trabalho essa é a norma que impera. Não é a presença da reclamada e seu procurador à audiência que torna preclusa a livre opção pelo reclamante de desistência do processo, mas o ato de apresentação da resposta.”
No mais, sem a necessidade de maiores digressões doutrinárias a respeito do “due process of law”, sendo importante apenas o registro de que “O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado – persecutor e plenitude de defesa (direito à defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal)”, no dizer Alexandre de Moraes, sob a inspiração das teorias doutrinárias desenvolvidas por J.J. Canotilho sobre esse megaprincípio.
Por sua vez, importante também a lembrança feita por PAULO LOBO SARAIVA, in “Comentários ao Estatuto da EAOAB”, de que, “mesmo cabendo à OAB promover com exclusividade a polícia administrativa da advocacia brasileira, ficando no mesmo alcance dessa exclusividade a defesa e a representação dos advogados”, deve ainda a Instituição “estimular que outras entidades surjam, congregando advogados, para finalidades culturais e científicas, assistenciais e sindicais, porque todas contribuem para o fortalecimento da classe”, como a ASSAT é assim prestigiada.
Portanto, a minha convicção de que o Tribunal Regional do Trabalho da 20ª. Região e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CNJT, visto que o art. 22, da sua Resolução 94, de 23/03/2012, que estabeleceu parâmetros para utilização e funcionamento do PJe-JT, possui o mesmo conteúdo temático do art. 3º., do ATO TRT/20-SGP.PR n. 024/2012, juntamente com o Conselho Gestor do Sistema – PJe-JT, deverão adotar imediatas providencias para solucionar essa grave distorção processual ao direito de defesa como garantia do due processs of law.
Fonte: Site OAB